E o Brasil pegou fogo, literalmente. Em 2019, as duas primeiras semanas de agosto tiveram céu escuro em pleno dia em boa parte da região centro-sul e sudeste do país. A razão foram queimadas recordes na Amazônia. Uma nota técnica do Intituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE e outra do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia - IMPA mostraram a extensão do fenômeno, sua associação com atividade humana e as consequências possíveis da ocorrência. As nuvens de fumaça se espalharam por boa parte da América do Sul.
Mas o apagão do Brasil não ocorreu agora, e sim nas últimas eleições presidenciais, quando Jair Bolsonaro foi eleito. Uma figura populista, caracterizado por discurso extremista, homofóbico, misógino, preconceituoso com negros, nordestinos e outros brasileiros fora do eixo Rio-São Paulo. Ele montou um governo de pessoas despreparadas, polêmicas, associados com processos por corrupção, igualmente extremistas e defensores de posições preconceituosas. Já ocorreram reversões de conquistas históricas da sociedade brasileira em questões como política ambiental, indígenas, questões trabalhistas, educação, saúde e até mesmo o orçamento para ciência e tecnologia. Este novo governo dá mostras de que não vai deixar pedra sobre pedra.
Usando o pretexto de ser eficiente e enxugar a máquina estatal, o governo brasileiro recém-montado está dando mostras de extrema ineficiência e sinalizando que não somente não vai diminuir o tamanho do Estado, mas vai cooptá-lo para interesses próprios. Além disso, coloca cada vez mais figuras militares em cargos de confiança e postos técnicos do governo, mostrando que pretende alavancar uma gestão ideológica, não técnica. Por isso mesmo, até o momento, praticamente não resolveu nenhum dos problemas que impede o funcionamento do governo. Nenhum ministério, e muito menos o executivo federal, tem um plano de governo ou ao menos uma agenda clara sobre o que pretende. É quase certo que não pretendem nada mais do que tomarem de conta da máquina governamental e utilizá-la em seu próprio benefício.
A incerteza já começa a impactar o mercado, ilustrado pela desvalorização do Real em relação ao dólar, aumento da inflação, aumento da dívida pública e do gasto do governo. Ministros foram exonerados e ameaçaram denunciar corrupção na campanha eleitoral (oficialmente a mais cara do mundo) e no governo Bolsonaro. Com declarações polêmicas, Bolsonaro e seus ministros acumulam desafetos com celebridades e políticos do mundo inteiro, e se aproximam de tiranos e líderes neonazistas. A impressão que se tem em Brasília é de um avião sem piloto e voando às escuras.
A tragédia ambiental amazônica (que coincidentemente ocorreu logo após Bolsonaro discursar para donos de terra da região, indicando que eles tinham o direito de fazer o que bem entendessem) não foi a primeira desse ano e parece que não será a última. No início do ano a barragem de Brumadinho arrebentou, matando centenas de pessoas e mudando um bioma do tamanho de países, com consequências trágicas para o meio ambiente que ainda não são conhecidas. Esse evento pôs à mostra um país onde empresas de mineração não são fiscalizadas, onde um governo corrupto se alia a interesses do capital e fecha os olhos para graves problemas ambientais e sociais causados pela exploração mineral.
E não pára por aí. Não acho que a perspectiva é positiva. Todos os desafios que surgirem diante de nosso país durante este governo estarão sistemicamente perdidos, pois estamos diante de um grupo que não se interessa pela sociedade, mas apenas por si mesmo e por quem os apóia com dinheiro. Espero que pelo menos a natureza nos seja mais leve nos próximos anos. Porém, não podemos realmente contar com isso.